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Atendimento por Skype: uma realidade de nosso tempo

Atualizado: 12 de fev. de 2019

“O virtual, rigorosamente definido, tem somente uma pequena afinidade com o falso, o ilusório ou o imaginário. Trata-se, ao contrário, de um modo de ser fecundo e poderoso, que põe em fogo processos de criação, abre futuros, perfura poços de sentido sob a platitude da presença física imediata” – Pierre Levy no livro: O QUE É O VIRTUAL?, 1996.


No mundo de hoje a Internet faz parte de nossa vida, esse escrito que você está lendo dentro do Ciberespaço é prova viva disto. A Psicologia é atravessada por essa Era e, mesmo nós que trabalhamos em consultórios particulares, em nossas salas – matéria física – nos vemos às voltas com essa “invasão” da Internet. É cada vez mais comum ouvir histórias de psicólogos que atendem por Skype e os motivos que levam a esse caminho são diversos: mudança do paciente para outro país-cidade, paciente que por alguma circunstância fica restrito em casa (doença, gravidez, puerpério), paciente que viaja frequentemente à trabalho, um brasileiro que mora fora do país e quer fazer terapia com alguém de sua língua e cultura natal, uma pessoa que vive em numa pequena cidade e quer um psicólogo de fora para resguardar o sigilo, o psicólogo que se muda do Brasil… e, assim vai… Nossos tempos convidam o psicólogo a também habitar o ciberespaço, lugar feito por pessoas, lugar de conexão em essência. Somos empurrados para esse espaço virtual. Espaço esse no qual o encontro também pode se dar, uma escuta pode acontecer e uma conversa terapêutica mediada pelo computador se faz possível.


Mas e aí? Como se faz isso? O que se exige do psicólogo que irá desbravar esse caminho do atendimento nessa modalidade outra?


Pensamos que o primeiro ponto relevante consiste em sinalizar o quão fácil é nos precipitarmos em visões estereotipadas ou preconceituosas sobre o fenômeno. É difícil acolher verdadeiramente a nossa ignorância sobre o assunto. A experiência também nos lança em território distinto e é fácil recorrer à tentação de “cartilhas” que regrem e “organizem” a prática.  Esses referenciais são bem-vindos, mas possivelmente sejam ainda insuficientes e descompassados para compreender o que se apresenta na atualidade.


Terapia por Skype : qual a especificidade dessa modalidade de atendimento?


O objetivo desse texto seria o de compartilhar algumas das modestas aprendizagens e questões amadurecidas nesse caminho.


Em primeiro lugar destacamos a importância de assegurar o setting e a estrutura: um bom suporte físico, ou seja, um bom computador, uma câmera e microfone de qualidade, um antivirtus confiável, uma boa conexão com a Internet e um espaço físico cuidado, iluminado, silencioso.  O cuidado e investimento com o espaço físico que um bom profissional despende em seu atendimento presencial, deve ser transportado para o atendimento online. Pode parecer trivial, mas ressaltamos como é essencial garantir essa ambiência. Mesmo porque o paciente não chega em uma sala silenciosa, reservada na qual há garantias de certas condições. Ele também precisa ativamente responsabilizar-se por isso. É interessante situar a questão do contrato nesse contexto. Lembremos de uma paciente que frequentemente buscava cafeterias; livrarias e outros contextos similares para as sessões. Ela conseguiu dar-se conta da precariedade que essas escolhas representavam para o trabalho. Foi justamente esse aspecto formal do enquadre “fugidio” do atendimento online o quê proporcionou oportunidade para uma série de efeitos e avanços importantes. Também aprendemos sobre a necessidade de reafirmar certos pactos; compromissos e limites: “sim: só vamos trabalhar se ambas conseguirmos preservar umas condições básicas de visibilidade, silêncio no ambiente, conectividade; etc.”.


Se a supervisão é essencial como aliada da nossa escuta e intervenção, ela também se faz fundamental nesse caso: dá mais elementos para sustentar essa aposta de que é possível caminhar nesse território de areias mais movediças e desconhecidas. Por exemplo: e como se operacionaliza a questão do pagamento? E o que se escuta e combina nessas situações? E que ressonâncias e matizes apresenta na singularidade de cada caso? “Quero te pagar com outra frequência; porque a incidência de impostos para envio de dinheiro ao estrangeiro é menor caso acordemos outro esquema. Você topa?”.

Apesar, de o formato ser diferente – através do computador – o psicólogo continua sendo psicólogo, a posição ética, a escuta qualificada e a presença terapêutica permanecem.


Assim sendo, essa escolha – suas motivações; implicações e limites também devem ser ventiladas e tratadas. É fundamental que esse caminho seja considerado legítimo, oportuno. Evidentemente que se trata de um modelo distinto. Mas isso não significa que seja intrinsecamente desprovido de potências.


No atendimento por Skype a questão do foco é levada ao extremo, já que a presença física não se coloca. No atendimento online, na maioria das vezes, seu paciente se apresenta como uma cabeça (enquadre da tela), mas o discurso, as histórias e os sentidos permanecem. Talvez para um psicólogo que trabalhe fundamentalmente baseado em outros vieses que não o da escuta (corporais, por exemplo) um trabalho pela Internet seja impossível. Porém, aqueles que tem como base de seu ofício: a conversa, a narrativa, o quê se fala e o quê se escuta, um trabalho no ciberespaço é possível de acontecer e já está acontecendo. Vale lembrar que a existência de redes (como pontes com psiquiatras através de email ou whatsapp, por exemplo) se faz de uma pertinência importantíssima em algumas situações.


O oficio do psicólogo online é algo fresco, pulsante e vivo. Havemos de reconhecer que ainda se faz necessário avançar nos campos da legislação, das diretrizes, das discussões éticas sobre os limites e potências desse formato. Mas isso não anula o trabalho e a parcerias terapêuticas que já acontecem entre psicólogos e pacientes em seus encontros online. A Psicologia é feita por pessoas e para as pessoas, na dedicação de levar cuidado e escuta qualificada para àqueles que sofrem, que estão incomodados, que querem se conhecer mais. Que possamos usar a potência de conexão e a quebra das barreiras geográficas para que nosso ofício alcance àqueles que poderiam se beneficiar com nosso trabalho, onde quer que estejam.


Esse texto também está publicado na Coluna Desha: https://coluna.desha.com.br/atendimento-por-skype-uma-realidade-de-nosso-tempo-natalia-vidal/

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